005: Técnica: Tipos de Verso (parte 2 de 4)

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Continuando o post anterior, este mostra quais são os versos elaborados. Eles são versos que para serem feitos, exigem um determinado domínio e compreensão das batidas da base instrumental, pois as rimas, nestes tipos de versos, ficam atreladas à batida.


Os versos elaborados são cinco:

  • Verso Duplo;
  • Verso Triplo;
  • Verso Diagonal;
  • Verso Trocado;
  • Verso Poético.

 

Verso Duplo (elaborado)

Ao se acrescentar um segundo par de rimas em um verso simples, cada um em uma frase, cria-se um verso duplo. Ele espelha as rimas da primeira frase com as rimas da segunda frase. É uma boa técnica, que foge do lugar comum e torna o discurso mais ritmado. O verso duplo pode ser encontrado na maior parte das letras já compostas.

 

Armas frias apontadas¹ / rumo ao 121².//
Na deles não sou nada¹, / no inferno só mais um².//
(“Cair da Noite”, Fred/CRA)
 
E sigo em frente¹, / mantendo a corrente forte².//
O coração bate sempre¹ / sentido Zona Norte².//
(“Contexto”, Marcelo D2)

 

A representação gráfica do verso duplo:

___1___2
___1___2

 

Também é possível empregar não a segunda batida da frase, mas a terceira, para que a primeira rima (¹) se desloque para frente:
 

Quem se casou / quer criar / o seu pivete¹ / ou não2.//
Cachimbar / e ficar doido / igual muleque¹, / então2.//
(“Periferia é Periferia (em qualquer lugar)”, Edi Rock)

Mano! / Que loucura / te ver¹ / agora2.//
Há um tempo, / pá de tempo, / você¹ / foi embora2.//
Nossa chance / acabada, / era o fim³/ da fita⁴.//
Da parada, / da zueira / que aqui³ / se via⁴.//
(“Chances”, Sangue B.)
 

A representação gráfica, neste caso, seria ligeiramente diferente:

_____1_2
_____1_2

 

Verso Triplo (elaborado)

Continuando do raciocínio, podemos adicionar mais uma dupla de rimas ao verso, toralizando três duplas de rimas paralelas. Não é uma rima comum de se encontrar, principalmente se feita propositadamente. O mais comum é que ela acabe aparecendo em um verso por mero acaso, simplesmente devido ao acréscimo de rimas.


Minha mente¹ / a milhão², / cada vez / mais confusa³. //
Minha gente¹, / irmão², / cada vez / mais afunda³. //
(“O Sonho”, KLJay)
 
Não sei qualé / que pum¹, / qual que ², / qual que foi³!//
Quemé quem / que dá um¹, / que não ², / que dá dois³!//
(“Apelidado Xis”, Xis)

 

O gráfico que representa o verso triplo é bastante semelhante aos anteriores:

___1_2_3
___1_2_3

 

Verso Diagonal (elaborado)

Por vezes, em construções inusitadas de versos, surge uma oportunidade de manter a rima colocada na metade de uma frase com a rima colocada no fim de outra frase. É algo estremamente peculiar, já que a própria levada torna-se estranha ou diferente do convencional. Se feito errado, parecerá que o rapper colocou a rima no local errado, ou que está cantando errado sobre a batida.


Minha / condição / é sinistra¹. / Não posso //
dar rolê, / Não posso ficar / de bobeira / na pista¹!//
(“Soldado do Morro”, MV Bill)

 

O gráfico, neste caso, seria:

___1___x
___y___1


Esse lugar é um pesadelo / periférico¹!//
Fica no pico numérico¹ / de população.//
(“Periferia é Periferia (em qualquer lugar)”, Edi Rock)

Uma variação diferente da anterior:

_______1
___1___x

 

Verso Trocado (elaborado)

Pegue um verso duplo e troque a posição das rimas de uma das frases e você obterá um verso trocado. Muito incomum, ele ganhou força junto à Nova Escola do RAP Nacional (os grupos que baseiam seu estilo no freestyle e nas levadas não convencionais). Como Thaíde explica em sua letra “Fúria Verbal), a fórmula para este verso é “a segunda com a terceira, e a primeira com a última”. Ele até mesmo exemplifica dentro da letra:


Use bem o papel e caneta¹. / Olhe pra mim², //
pequeno aprendiz². / Aqui é muita treta¹.//
(“Fúria Verbal”, Thaíde e DJ Hum)

O gráfico é bem simples também:

___1___2
___2___1

 

Verso Poético (elaborado)

Raramente visto no RAP (salvo em refrões), este verso tem uma estrutura muito  utilizada na poesia, onde o final de quatro frases rimam em uma seqüência 1-2-1-2. Pode ser visto como uma espécie de verso duplo, porém, com sua estrutura dividida em frases, e não em “metade de frases”. E diferente da maioria dos versos, ele encontra-se em quatro frases, e não em duas. O verso poético exige uma preocupação maior por parte do rapper, para que a rima fique aparente (mesmo que sua sonoridade torne-se comprometida e enfraquecida pela distância espacial entre as rimas). Se feito da maneira certa o que resulta é um verso elegante e criativo.


Pode por uma fé mano, / juro amor eterno a ela¹.//
Prometo dar um tempo / na balada e no rolê².//
Já bate uma saudade cabulosa / do Itaquera¹//
– dos manos tudo no apetite, / no proceder².//
(“Por Você”, Xis)

O gráfico para o verso poético se estende para dois versos ao invés de apenas um:

_______1
_______2
_______1
_______2


 

005: Técnica: Tipos de Verso (parte 1 de 4)

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Entramos agora em um assunto de extrêma importância, a posição das rimas dentro de um verso. Existe uma maneira de se classificar os versos de acordo com a posição que a rima se encontra dentro dele. O processo é simples: basta identificar qual palavra rima com qual e ligá-las. A fazer isto, notaremos que muitas vezes as rimas estão divididas dentro das próprias batidas da instrumental.

 

Veja que todos os versos podem ser divididos em duas grandes categorias, de acordo com sua complexidade. Em primeiro lugar estão os versos não elaborados. Eles são aqueles que para serem construídos, basta o acréscimo de rimas. Por esta razão, a maioria das letras possuem estes tipos de versos, e os rappers que se preocupam mais com o conteúdo do discurso e menos com sua estrutura, costumam ter letras onde os versos não alaborados são abundantes.

 

Já os versos elaborados necessitam de uma maior compreensão da teoria a que a formação dos versos se prendem. Também é preciso uma certa prática para que os versos elaborados escolhidos se adequem à levada do rapper. Na verdade, a levada aqui é primordial para a escolha do tipo de verso que será (ou serão) utilizados em uma letra. Enquanto os versos não elaborados se adequem facilmente à maioria das bases, os versos elaborados necessitam de um maior domínio por parte do rapper.

 

Abaixo está a lista de versos não elaborados. Nos próximos posts explicarei a mecânica dos versos elaborados e algumas situações especiais.

  • Verso Simples;
  • Verso de Três Rimas;
  • Verso Direto.

 

Verso Simples ou Tradicional (não elaborado)

A maior parte dos versos são versos simples, ou seja, aqueles que possuem uma única rima, no final das frases. Muitas vezes o primeiro esboço de uma letra possui muitos versos simples, mas com o acréscimo de mais rimas às frases ele tende a ser substituído por outras formas de verso. Pode ser difícil, de início, acrescentar mais rimas ao discurso e conseguir manter sua levada intacta, mas é uma técnica que exige um pouco de prática e esforço por parte do rapper.

 

Chegou o fim de semana, / todos querem diversão¹.//
Só alegria, / nós estamos no verão¹.//
(“Fim de Semana no Parque”, Racionais MC’s)

Família pobre, / dignidade tem de sobra¹.//
Apesar de analfabetos / esse assunto não os incomoda¹.//
(“ Cada Um Por Si”, Sistema Negro)

 Existe uma maneira gráfica de representar o verso simples. Seria assim:

_______1
_______1

 

Verso de Três Rimas (não elaborado)

O acréscimo de uma rima a um verso simples resulta em um verso de três rimas. No entanto, a posição da terceira rima costuma ficar junto à segunda batida (seja da primeira ou da segunda frase). Veja os exemplos:

 

Apoiados por cinquenta / mil manos¹... //
Por manos¹, não por / fulanos¹... //
(“Hora H”, 509-E)

 

A representação gráfica de um verso de três rimas:

___1___1           ou          _______1
_______1                          ___1___1

 

Verso Direto (não elaborado)

Acredito ser desnecessário dizer que os nomes dados aos versos foram de minha criação. Desta forma, podem parecer estranhos ou inadequados para algumas pessoas. Este verso, por exemplo, mostrou-se muito difícil classificar. É um verso de duas rimas (ou mais), que se apresentam na mesma frase. Não costuma ser comuns, pois cria-se a dificuldade de rimar o próxio verso, já que a composicão das letras se baseia em um número par de frases. Normalmente a frase que segue um verso direto é também outro verso direto (com outras rimas), ou então uma palavra sem verso algum (veja rima branca no post sobre tipos de rimas), ou até mesmo uma frase com uma palavra solta, colocada apenas para rimar com qualquer outra palavra de algum outro verso próximo.

 

Nunca estão conscientes¹, / nunca se importam com a gente¹.//
(“Geral”, Consciência Humana)

Farinha ainda é pouco¹, / pra cachorro louco¹!//
(“Capítulo 4, Versículo 3”, Racionais MC’s)


Mano¹! / Será que eu / estou em / outro plano¹?//
Em outra / atmosfera²? / Na paz / ou na guerra²?//
(“2092: Lei da Rua”, Xis)

 

O gráfico para este verso:

___1___1